Muitas pessoas demonstram grande interesse em adquirir um cão e criá-lo em apartamento. Entretanto, imaginam equivocadamente, ser impossível realizar tal desejo, supondo existir impeditivo de ordem legal.
Efetivamente, quando uma pessoa deseja manter um cão em apartamento, a primeira coisa que deve ter em mente é que não se mede o espaço que o cão vai utilizar pelo seu tamanho e, sim, pelo seu temperamento. Assim, não significa que um cão grande tenha que ocupar grande espaço, pois muitos cães pequenos necessitam muito mais espaço para circular que um cão de grande porte.
Outras pessoas vêm como impeditivo para ter um cão em apartamento determinadas cláusulas da convenção do condomínio do seu prédio. Na verdade, juridicamente, a convenção do condomínio faz lei entre os condôminos, porém, não tratam-se de normas cogentes definitivas.
Os direitos e deveres dos condôminos dos edifícios de apartamentos estão regulamentados pelo Código Civil, naquilo em que não contrariarem a Constituição. Mesmo que a convenção do prédio proíba a presença de animais existem jurisprudências a respeito do assunto. Vejamos:
Ementa: Condomínio de apartamentos. Ação que visa a retirada de cão da raça pastor alemão. A sentença que julga antecipadamente ação em que se discute a presença de cão da raça “pastor alemão” como base no porte e na agressividade peculiar da espécie, discrimina e viola o direito da parte adversa em demonstrar o contrário, mormente quando houve expresso requerimento de provas com indicação de testemunhas e a convenção tolera a permanência de animais que não causem incômodo ao demais moradores a saber pela existência de cães de menor porte. Sentença anulada. Apelo provido. Fonte: Acórdão do processo nº 195120783, Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, julgado em 21.09.95.
Ementa: Ação de consignação em pagamento. A ação de consignação em pagamento admite a discussão sobre a interpretação de cláusula contida em Convenção de Condomínio. Norma proibitiva de guarda de animal doméstico. Interpretação finalística da vedação, que não se aplica quando o cão, que não circula nas áreas comuns, não apresenta incômodo aos demais condôminos, tampouco traz qualquer risco à segurança destes ou a higiene do prédio. Multa imposta aos condôminos que é de ser considerada inválida, eis que abusiva. Apelo provido. Fonte: Acórdão do processo nº 599071123, Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, julgado em 09.03.99.
Ementa: Condomínio. Animal em apartamento. Não contraria cláusula da convenção condominial a permanência de cão da raça cocker spaniel, em uma unidade autônoma de edifício de apartamentos, desde que a permanência do animal não se mostre nociva aos demais moradores do condomínio. Fonte: Acórdão do processo nº 190019943, Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, julgado em 29.05.90.
No mérito, diz que a cláusula condominial que proíbe a presença de animais em geral é inválida. Alega que o direito de propriedade não pode ser limitado por convenção de condomínio. Alega que a norma de condomínio que veda a presença de animais viola a Constituição Federal, o Código Civil e a Lei n.º 4.591/64. Aduz que a exceção seria aos animais que comprovadamente apresentassem risco à segurança aos demais condôminos. Aduz não ser notória a periculosidade de um cão da raça “pit bull”. Menciona que norma condominial não pode vedar o que a lei autoriza, mais especificamente a lei Estadual n.º 12.353, a qual autoriza a circulação de animais em locais públicos.
Normalmente, quem tem um animal em apartamentos não costuma deparar com questões como as relacionadas a cães bravos, pois dificilmente opta por um animal de grande porte e de guarda. Mas pode esbarrar na intolerância dos vizinhos, nas convenções de condomínio ou numa eventual inadequação do animal a espaços pequenos. "Antigamente era comum os estatutos proibirem animais, mas a quantidade de ações vitoriosas na Justiça provou que esse arbítrio é totalmente ilegal", afirma Silvia. Em São Paulo, por exemplo, a Lei 10.309 (Art. 17) de 22/4/87 determina: "A manutenção de animais em edifícios condominiais será regulamentada pelas respectivas convenções". Porém, a Lei Federal 4.591/64, em seu Artigo 19, diz: "cada condômino tem o direito de usar e fruir com exclusividade de sua unidade autônoma, segundo suas conveniências e interesses, condicionadas umas às outras às normas de boa vizinhança". As sociedades protetoras dos animais tiveram um papel fundamental na divulgação das sentenças favoráveis aos proprietários, o que levou a maioria dos condomínios a abolir essa cláusula de seus estatutos.
A jurisprudência garante a permanência de animais de pequeno porte. Os maiores podem ser alvo de discussão, mas a decisão depende do entendimento do juiz em relação aos possíveis prejuízos causados pelo animal. Segundo Silvia, tanto a Constituição quanto o Código Civil garantem ao dono o direito de propriedade. Se o animal está com o dono há mais de seis meses, é direito adquirido.
O que não se pode discutir é a autoridade dos condomínios em legislar sobre as áreas coletivas. O condomínio pode proibir um cãozinho de passear nos jardins do prédio, ou de andar no elevador, mas não de morar com seus donos. Da mesma forma, a presença de animais inconvenientes, que perturbem a ordem, a higiene e o sono dos outros moradores pode ser questionada.
E isso independe do porte do animal. Um papagaio pode incomodar mais do que um cachorro, por exemplo, e se prejudicar a norma da boa vizinhança pode ser impedido de permanecer. Nesse caso, o próprio dono deve tomar providências por uma questão de respeito e cidadania, e não esperar por processos judiciais. "Mas se a presença do animal não viola as leis, ele pode ser mantido a despeito dos protestos do síndico ou dos vizinhos", diz Silvia. Quem tem animais na zona urbana também precisa observar as leis que determinam a quantidade máxima permitida por residência. No município de São Paulo, por exemplo, a Lei 10.309, (Art. 29), permite até dez animais adultos, considerando cães e gatos juntos.
Seguem mais entendimentos jurisprudenciais:
CONDOMÍNIO - CONVENÇÃO- Cláusula impeditiva da presença de animais. Cão da raça Lhasa Apso, de porte pequeno e dócil. Regra a ser interpretada de acordo com a finalidade preconizada nos artigos 10, III, e 19, da Lei n. 4.591/64, sob pena de configurar abuso. Ação movida pelo Condomínio para condenar o dono a retirá-lo do prédio julgada improcedente. Precedente da Corte. Recurso improvido." (TJSP ? AC 117.043-4 ? 3ª CDPriv. ? Rel. Des. Carlos Roberto Gonçalves ? J. 30.01.2001? Fonte: www.tj.sp.gov.br)
"AÇÃO DE DESPEJO POR INFRAÇÃO CONTRATUAL CONSISTENTE NA MANUTENÇÃO DE CÃO DE PEQUENO PORTE EM APARTAMENTO EM CONTRADIÇÃO COM O REGULAMENTO DO CONDOMÍNIO ? Sentença de improcedência. Julgamento antecipado da lide. Necessidade de produção de prova oral a fim de verificar se a presença do cão causa transtornos aos demais condôminos. Interpretação finalística da cláusula proibitiva. Procedência do recurso para cassar a sentença permitindo a produção de prova oral. (IRP)" (TJRJ ? AC 25957/2001 ? (2001.001.25957) ? 3ª C.Cív. ? Rel. Juiz Subst. Gabriel Zefiro ? J. 13.12.2001? Fonte:www.tj.sp.gov.br)
"CONDOMÍNIO - Convenção - Vedação da manutenção de animal doméstico nas unidades autônomas - Regra, contudo, que deve ser interpretada em consonância com as regras gerais sobre condomínios - Artigos 10, III, e 19 da Lei 4.591/64 e 554 do Código Civil - Hipótese em que condicionada a observância da convenção à comprovação de eventos nocivos ao sossego dos condôminos - Ação improcedente - Recurso não provido. A manutenção de animal doméstico em apartamento só é vedada quando nocivo ou perigoso ao sossego, salubridade e à segurança dos condôminos." (TJSP - Apelação Cível n. 251.579-2 - Jundiaí - Relator: RUY CAMILO - CCIV 15 - V.U. - 20.12.94? Fonte:www.tj.sp.gov.br)
"CONDOMÍNIO - Animal doméstico em apartamento - Convenção que é expressa ao proibir a presença de animais - Ação julgada procedente - Sentença confirmada - Recurso não provido." (TJSP - Apelação Cível n. 24.869-4 - Bauru - 1ª Câmara de Direito Privado - Relator: Alexandre Germano - 22.12.98 - V.U. ? Fonte: www.tj.sp.gov.br)
"CONDOMÍNIO - Convenção - Vedação da manutenção de animal doméstico nas unidades autônomas - Regra, contudo, que deve ser interpretada em consonância com as regras gerais sobre condomínios - Artigos 10, III, e 19 da Lei n. 4.591/64 e 554 do Código Civil - Hipótese em que condicionada a observância da convenção à comprovação de eventos nocivos ao sossego dos condôminos - Ação improcedente - Recurso não provido A manutenção de animal doméstico em apartamento só é vedada quando nocivo ou perigoso ao sossego, salubridade e à segurança dos condôminos." (TJSP - Relator: Ruy Camilo - Apelação Cível n. 251.579-2 - Jundiaí - 20.12.94? Fonte:www.tj.sp.gov.br)
"CONDOMÍNIO - Convenção - Vedação da manutenção de animal doméstico nas unidades autônomas - Regra, contudo, que deve ser interpretada em consonância com as regras gerais sobre condomínios - Artigos 10, inciso III, e 19 da Lei Federal n. 4.591, de 1964, e 554 do Código Civil - Necessidade da comprovação de eventos nocivos e perigosos que pudessem ser atribuídos ao animal que o réu mantém em seu apartamento - Ação improcedente - Recurso não provido." (JTJ 167/32? Fonte: www.tj.sp.gov.br)
"CIVIL - CONDOMÍNIO - PROIBIÇÃO DE MANUTENÇÃO DE ANIMAIS DOMÉSTICOS E AVES NOS APARTAMENTOS MULTA APLICADA A DUAS CONDÔMINAS - AÇÕES CONSIGNATÓRIA RIA E DE COBRANÇA APENSADAS E JULGADAS NA MESMA SENTENÇA COM PROCEDÊNCIA DA PRIMEIRO E IMPROCEDÊNCIA DAS OUTRAS - APELAÇÃO DO CONDOMÍNIO. 1. A cláusula de convenção condominial restritiva do direito de condômino ter animal doméstico em seu apartamento tem caráter meramente resguardativo e não impositivo absoluto e precisa ser interpretada de acordo com a relatividade que caracteriza o seu significado, devendo ser aplicada apenas naqueles casos em que o animal introduzido na comunidade condominial seja de grande porte e cause perturbação do sossego e do bem-estar ou ponha em risco a saúde dos vizinhos, não podendo de forma nenhuma ser aplicada à manutenção de um gato ou de um cão cocker spaniel em apartamento. 2. Apelação a que se nega provimento." (TJRJ - Apelação Cível - Número do Processo: 2003.001.00356 - Data de Registro : 15/04/2003 - Órgão Julgador: 16a. Câmara Cível - Des. DES. MIGUEL ANGELO BARROS - Julgado em 18/03/2003 ? Fonte: www.tj.rj.gov.br)
"APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA. ANIMAL DOMÉSTICO. MANUTENÇÃO EM UNIDADE CONDOMINIAL. Inexistindo cláusula que vede a presença de animal no Condomínio, mas tão somente regras que criam restrições diante do inequívoco prejuízo causado aos demais condôminos, deve ser declarada a possibilidade de manutenção do animal quando a parte adversa, alheia ao princípio (art. 302, do CPC), não ataca a inexistência de comodidade aos demais co-proprietários. Recurso provido." (TJRJ - Apelação Cível - n.2002.001.28128 - 01/04/2003 - 11a. Câmara Cível - Des. José C. Figueiredo - Julgado em 12/02/2003 ? Fonte:www.tj.rj.gov.br).
Em recente dedicão do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, mulher de 79 anos obtém direito a circular com seu cão em elevador de condomínio.
Ainda que acolhidas por maioria ou totalidade dos moradores, regras condominiais não podem adquirir caráter incontestável. O entendimento, unânime, é da 17ª Câmara Cível do TJRS e está expresso na decisão que manteve tutela antecipada permitindo a mulher de 79 anos circular livremente em condomínio, inclusive no elevador, com seu cão.
No apelo, o Condomínio Edifício Residencial Dutra pretendia reverter sentença da Comarca de Santa Maria, fazendo valer o artigo 6, letra "m", da convenção, que permite a presença de pequenos animais nos apartamentos e, fora deles, determina que sejam conduzidos apenas pelas escadas e no colo dos donos. Com a eventual concessão do efeito suspensivo, pleiteou cobrar da idosa multa pelas penas cometidas.
Conforme a Desembargadora Elaine Harzheim Macedo, sendo incontestável o fato de que a senhora usa o elevador na companhia do cachorro, cumpria decidir sobre a proibição de fazê-lo. Dessa forma, a relatora discorreu sobre a "imperatividade" de certas normas de condomínio - muitas delas restritivas quanto a convivência com animais - seguidamente tornadas sem efeito.
"Tudo sem prejuízo da responsabilidade dos donos dos animais quanto à sujeira eventualmente causada nas áreas comuns ou de terceiros", ressalvou. "E uma questão de aplicá-las, curando a doença e não matando o doente com a proibição da possibilidade e direito da pessoa possuir um cão ou outro animal doméstico."
Explicou que não foi ofertada nenhuma prova de transtornos aos vizinhos pela atitude da mulher, quanto mais o animal não estivesse na categoria dos considerados "ferozes". Num viés psicológico da análise, a Desembargadora ressaltou a importância social e terapêutica da convivência com bichos de estimação e os cuidados cada vez maiores dispensados com os idosos.
E concluiu: "Por sinal, pessoa de idade avançada, enfrentando naturalmente dificuldades para subir e descer cinco andares de escada, a representar excessiva onerosidade da regra imposta, correndo-se o risco de danos à sua saúde, com o agravamento de seu quadro clínico, sem falar no aspecto emocional".
Negando o recurso, a magistrada concedeu a livre circulação com o animal apenas para a idosa, excluindo familiares e visitantes. Votaram de acordo com a relatora o Juiz-Convocado ao TJ Luiz Roberto Imperatore de Assis Brasil e o Desembargador Alzir Felippe Schmitz. O acórdão consta da edição de junho/2005 da Revista de Jurisprudência. (Proc. nº 70009504473 - com informações do TJRS).
Desta sorte, podemos concluir que: ainda que a convenção proíba a permanência de animais em prédio, se na hipótese não há violação do Código Civil e dos arts. 10,III e 19 da Lei de Condomínio, o animal pode ser mantido, mesmo sob protesto do sindico e demais moradores do prédio.
A Constituição brasileira é bem clara no artigo 5º quando diz que cada cidadão tem o direito, no interior do seu lar, de proceder de acordo com os seus interesses, gostos e condições econômicas, podendo usar livremente o que lhe pertence. E o artigo 1º da Lei 4691/64 que rege os condomínios e as incorporações reforça o dito na Constituição.
Se a presença do animal não fere os direitos de vizinhança, o morador possuidor do animal está exercendo o seu legítimo direito de propriedade.
Não se pode taxar de ilícita a permanência no edifício de animais que não perturbem a segurança, o sossego e a saúde dos moradores do prédio conforme exigência do Código Civil. Você tem direito a ter seu animal de estimação, a lei garante este direito. A convenção do prédio não é soberana neste assunto. Se o seu animal não suja o prédio, não é barulhento, nem agressivo, a lei está do seu lado.
É evidente, entretanto, que se o dono mantém o cão de forma nociva e perigosa ao sossego, a salubridade ou a segurança dos demais condôminos, a lei não lhe dará guarida.
Existem também, neste caso, jurisprudências determinando a retirada do cão do convívio em edifícios. São casos raros evidentemente, porque a maioria dos proprietários de cães está ciente de seu dever de manter seu cão com segurança e respeitando a velha regra de que seu direito esbarra quando ultrapassa o direito do outro.
Esperamos ter dirimido as dúvidas daquelas pessoas que pensam em manter um cão em condomínios de apartamentos ou casas. Esta possibilidade existe, legalmente.
Fonte: (Dog Times)